Debate travado

Perspectivas políticas para 2008 esbarram na falta de iniciativa do governo e do Congresso para temas estratégicos

UM CLIMA de otimismo, sem dúvida mais intenso do que o habitualmente expresso nos votos protocolares de Ano Novo, parece difundir-se na população às vésperas de 2008.
Os bons resultados das vendas natalinas, as notícias de firme retomada no ritmo dos investimentos e nos índices de emprego contribuem, sem dúvida, para dar fundamento real a esse estado de espírito.
Transfira-se, contudo, da economia para a política o foco das atenções e dos prognósticos -e as razões para uma relativa confiança no futuro cedem lugar a motivos notórios de desalento. Não faltaram em 2007, e seria supérfluo traçar, neste espaço, o retrospecto dos escândalos que, em ondas sucessivas, abateram-se sobre partidos e personalidades os mais diversos.
Tão importante quanto o tema do descalabro ético na política brasileira -e contudo menos enfatizado do que este-, outro aspecto salta aos olhos quando se realiza a avaliação do ano administrativo e parlamentar de 2007. Durante longos meses, apenas dois assuntos monopolizaram a pauta das discussões: o caso Renan Calheiros e a emenda da CPMF.
Determinadas pela emergência moral ou financeira, essas questões não poderiam deixar de atrair a atenção da opinião pública. Mas não afastam a sensação da extrema penúria com que se desenrola o debate político no país. Escasseiam, para dizer o mínimo, iniciativas do Poder Executivo e do Legislativo no sentido de levar adiante propostas estratégicas em áreas de máxima relevância.
Reformas cuja necessidade é evidente -na Previdência, no sistema tributário, na legislação eleitoral- carecem de formulação concreta e de empenho político para serem postas em discussão. Da morosidade da Justiça à polêmica com respeito aos métodos contraceptivos, da organização partidária ao modelo de seguridade social, uma série de questões persiste intocada ao longo dos anos, e não há sinais de que o quadro possa mudar em 2008, para o qual estão reservadas, sobretudo, as discutíveis emoções da sucessão municipal.
O sistema político brasileiro se mostra, assim, não apenas bastante vulnerável à corrupção, mas também ameaçado por crescentes fatores de disfuncionalidade: não consegue atender de forma ordenada às demandas decisórias do conjunto da sociedade, muito menos canalizá-las com eficiência.
O país conviveu por longos anos com taxas de inflação altíssimas e índices pífios de crescimento até atingir, depois de um custoso processo de tentativa e erro, uma situação em que o debate econômico destituiu-se do muito que possuía de premência e exasperação.
As pautas polêmicas diversificaram-se, novas prioridades ganham destaque: parecem, contudo, travados os mecanismos de que se dispõe para traduzi-las em propostas legislativas, dentro de um debate democrático e transparente. A economia vai bem, na medida do possível; a política vai mal, entretanto, e não parece ir para lugar nenhum.