Estranha amizade entre Lula e Collor

Dois meses depois de ter sido criada oficialmente, a CPI da Petrobras foi afinal instalada na última terça-feira, sob controle de três senadores leais ao Planalto: seu presidente é João Pedro (PT-AM), suplente do ministro dos Transportes, Alfredo Nascimento; o vice é Marcelo Crivella (PRB-RJ), do partido do vice-presidente, José Alencar; e o relator é o líder do Governo, Romero Jucá (PMDB-RR). Foram eleitos por oito senadores do governo na comissão de 11 membros. A primeira decisão de João Pedro foi adiar para agosto qualquer outra decisão. Parece que a CPI está sob controle, mas hoje, no Senado, toda aposta é arriscada.


Nada pode estar sob controle enquanto o presidente José Sarney estiver acossado por denúncias – e o presidente Lula está sendo atraído cada vez mais para o centro dessa crise. Ele precisa sustentar José Sarney, um aliado muito especial, e arbitrar a disputa pessoal e política entre os líderes do PMDB, Renan Calheiros, e do PT, Aloizio Mercadante. O PT nunca foi notável por defender o governo no Senado e o PMDB cobra um alto preço por essa tarefa. A instabilidade aumenta porque no ano que vem dois terços dos 81 senadores vão disputar as eleições nos Estados. Nessa altura, o instinto de sobrevivência fala mais alto que as conveniências dos partidos e os interesses do governo.

Lula acabou se transformando no principal defensor de si mesmo. Na terça-feira, num palanque em Maceió, pagou o mico de elogiar, na mesma frase, Renan Calheiros e o ex-presidente Fernando Collor, adversário histórico do PT e único ex-presidente brasileiro deposto por corrupção num processo de impeachment, em 1992. “Eu quero aqui fazer justiça ao comportamento do senador Collor e do senador Renan, que têm dado uma sustentação muito grande aos trabalhos do governo no Senado.” Não foi o primeiro elogio nem deve ser o último, enquanto Renan for o chefe do PMDB e Collor o membro da CPI da Petrobras.

No dia seguinte, Lula mergulhou mais fundo. Numa entrevista na sede da Embrapa em Brasília, um repórter disse ao presidente o que a oposição pensa sobre a CPI da Petrobras: “Eles estão dizendo que essa CPI acaba em pizza temperada com pré- -sal”. Lula respondeu com o fígado: “Depende, todos eles são bons pizzaiolos”. A reação no Senado foi imediata. Cristovam Buarque (PDT-DF), ex-petista e ex-ministro de Lula, pediu um voto de censura ao presidente pela frase. Sem consultar o Planalto, Aloizio Mercadante pediu desculpas pela “frase infeliz” do presidente, mas Lula, segundo assessores, não retira uma palavra do que disse.

No fim do dia, o PMDB ajudou a oposição a rejeitar a renovação do mandato de Bruno Pagnoccheschi na direção da Agência Nacional de Águas. Ele foi indicado por Marina Silva (PT-AC) e caiu porque ela é adversária de Sarney e de Renan. Com Sarney na corda bamba, aliados que se autodestroem e dois terços da Casa de olho nas eleições, Lula só pode estar seguro de uma coisa: a cada dia, ele vai ter de se envolver mais na crise do Senado.