Governadora Yeda Crusius nomeia desembargador após lobby, diz PF
Folha Online - SP | 6 de novembro de 2009
Conversas telefônicas interceptadas pela Polícia Federal indicam que políticos investigados por suspeita de integrar um esquema de corrupção no Rio Grande do Sul fizeram lobby para que a governadora Yeda Crusius (PSDB) nomeasse um desembargador para o TJ-RS (Tribunal de Justiça).
A nomeação acabou ocorrendo, mas o governo gaúcho diz que não houve irregularidade e nega influência do lobby.
Em telefonema do dia 29 de dezembro de 2007, o então prefeito de Canoas (região metropolitana de Porto Alegre), o também tucano Marcos Ronchetti, pediu à governadora que nomeasse o advogado Gelson Stocker para uma vaga de desembargador do TJ-RS.
O grampo integra a chamada Operação Solidária, investigação da PF sobre uma suposta organização criminosa responsável por fraudar licitações, superfaturar preços e desviar recursos da merenda escolar em Canoas e obras públicas no município e no Estado. Ronchetti, que administrou Canoas entre 2001 e 2008, é suspeito de participar da fraude.
Na conversa em dezembro de 2007, o prefeito diz a Yeda que, além de possuir "altíssima competência", Stocker era fundador do PSDB e tinha "compromisso" com o governo.
No telefonema, a governadora sinaliza positivamente ao pedido: "Eu aprendi durante esse ano, viu, Ronchetti, que vou só usar a caneta para nomear quem tenha compromisso com o governo".
No dia 16 de janeiro de 2008, Stocker foi nomeado por Yeda para a vaga. O advogado tornou-se desembargador pela regra do chamado quinto constitucional, que destina uma parcela das vagas em tribunais para indicados da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil) e do Ministério Público. Yeda o escolheu na lista tríplice que passou pela OAB e pelo TJ.
A conversa entre Ronchetti e Yeda foi interceptada pela Polícia Federal porque o prefeito usou um celular de Francisco Fraga, então secretário de Governo de Canoas e o suposto operador do esquema de desvio, segundo a PF.
Fraga também é réu na ação criminal da fraude que desviou R$ 44 milhões do Detran (Departamento Estadual de Trânsito) gaúcho entre 2003 e 2007. Ele responde por suposto crime de extorsão.
Logo após a nomeação de Stocker, Fraga e a assessora pessoal de Yeda, Walna Vilarins de Menezes, combinaram em telefonema de 18 de janeiro uma visita de Stocker para agradecer Yeda pela indicação.
Na conversa, Fraga se refere a um suposto pedido que a governadora teria a fazer a Stocker e se prontifica a ser o emissário. "Eu comentei com ele [Stocker] que ela [Yeda] tem um pedido, eu não disse o que era. E ele disse não tem problema, atendo qualquer pedido. Quer dizer, já se comprometeu", diz Fraga a Walna.
Walna foi indiciada em agosto pela Polícia Federal sob acusação de corrupção passiva e formação de quadrilha.
Outro lado
Por meio de assessoria, a governadora Yeda Crusius negou que a escolha do advogado Gelson Stocker para ocupar vaga de desembargador do TJ-RS Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul tenha se dado por critérios partidários.
De acordo com o chefe da Casa Civil do governo, Otomar Vivian, a escolha não tem relação com o fato de Stocker ser tucano, mas com as credenciais profissionais do desembargador, que passou por listas elaboradas pela seção gaúcha da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil) e pelo TJ.
Vivian disse que pedidos de nomeação, como o feito pelo ex-prefeito de Canoas Marcos Ronchetti (PSDB) para escolher Stocker, são comuns.
Ronchetti é investigado pela Operação Solidária, da Polícia Federal, que apura um esquema de desvio de dinheiro público. A reportagem não conseguiu encontrá-lo ontem.
O desembargador Gelson Stocker disse à Folha que não exerce militância partidária no PSDB há 15 anos e que, desde que foi empossado no Tribunal de Justiça em fevereiro de 2008, não julgou casos envolvendo o governo ou políticos.
Ele disse que, no momento em que Ronchetti intercedeu por sua escolha, o prefeito ainda não era suspeito de desvios nem réu em processos.
"Estão dando uma conotação pejorativa ao fato de terem chegado informações sobre minha qualificação pessoal e profissional à governadora, o que é natural", disse Stocker.
Stocker esteve com a governadora em janeiro de 2008 para agradecê-la pela escolha --"uma praxe nestas situações", segundo ele-- mas negou que tenha recebido qualquer pedido feito pela governadora ou pelo ex-secretário de Canoas Francisco Fraga.
A reportagem não conseguiu localizar Walna Vilarins Menezes e com Fraga ontem. Em ocasiões anteriores, Walna havia negado qualquer ligação com irregularidades investigadas pela Polícia Federal. A defesa de Fraga também já negou as acusações.
GRACILIANO ROCHA
da Agência Folha, em Porto Alegre
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