Projeto do governo prevê até fechar empresa que paga propina
O Estado de S. Paulo - SP | 5 de julho de 2009
Proposta, em fase de conclusão na CGU e no Ministério da Justiça, será encaminhada ao Congresso neste mês
As empresas que cometem crimes contra a administração pública na tentativa de obter vantagem poderão passar a ser punidas civil e administrativamente pelo Estado. Aquelas que se beneficiam do pagamento de propina a servidores públicos, de fraudes em licitação, da lavagem de dinheiro e da maquiagem de serviços e produtos vendidos ao governo poderão ser multadas, impedidas de receber benefícios fiscais, fechadas temporariamente ou extintas, a depender da gravidade dos fatos. A novidade consta do projeto de responsabilização das pessoas jurídicas, que está em fase de conclusão na Controladoria-Geral da União (CGU) e no Ministério da Justiça. O texto será encaminhada ao Congresso ainda neste mês.
A legislação atual praticamente blinda essas empresas. Quando se envolvem em escândalos de corrupção, no máximo são punidas pelo mercado: a marca e a imagem são deterioradas e os clientes fogem para a concorrência. Se não houver esse prejuízo simbólico, porém, a empresa continua a funcionar normalmente. O Estado, hoje, não pode fazer praticamente nada contra elas.
A Lei das Licitações (8.666/93), por exemplo, é restrita a atos praticados contra a concorrência, e a punição mais grave restringe-se a declarar que a pessoa jurídica é inidônea e estará impedida de participar de outras disputas. Não há possibilidade de aplicação de multa ou de vedar o acesso dessas empresas a incentivos fiscais ou a empréstimos de bancos públicos. E atingir o patrimônio das empresas, o que elas têm de mais sagrado, mesmo estando envolvidas em casos de corrupção, é praticamente impossível.
JULGADOR
Com a legislação atual, a punição pela prática de outros crimes fica restrita ao funcionário, à pessoa física, como o diretor da empresa. "Tudo o que está previsto no novo projeto já é crime, mas hoje não temos a possibilidade de punir a pessoa jurídica", diz o secretário de Assuntos Legislativos do Ministério da Justiça, Pedro Abramovay.
O novo texto determina que a empresa, independentemente dos processos contra seus dirigentes, será julgada pelos atos praticados por seus funcionários ou representantes, mesmo que ela não tenha expressamente dado a ordem para que o crime fosse cometido ou obtido alguma vantagem. Por ser um julgamento administrativo, a intenção é garantir o máximo de celeridade no trâmite dos processos.
Um dos poucos pontos que ainda precisam ser definidos é o órgão que ficará competente para julgar essas empresas. A proposta mais recente define que empresas que pratiquem atos contra a União serão julgadas pela CGU. As demais serão punidas por órgãos específicos dos Estados.
Até o final das discussões, o governo pode deixar para a Controladoria-Geral da União a atribuição exclusiva de decidir sobre todos os casos, incluindo aqueles crimes que envolvam a administração pública estadual e municipal.
A ideia do governo é que o rito desses processos seja semelhante ao seguido pelo Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade), órgão vinculado ao Ministério da Justiça, para julgar empresas acusadas de cartel, por exemplo. O caso seria decidido em poucas sessões de um órgão colegiado da CGU, deixando para a pessoa jurídica a possibilidade de recorrer apenas ao Judiciário.
CONVENÇÃO
O efeito esperado pelo governo sobre as empresas é primordialmente educativo. A ameaça de punição severa e rápida coibiria a prática de corrupção e tornaria a concorrência mais leal. "Quem está pagando suborno está levando uma vantagem injusta e ilícita sobre as demais", afirmou o secretário executivo da controladoria, Luiz Augusto Navarro. "Além disso, tudo o que vai para a corrupção vem do Estado."
O texto preparado pelo governo atende à convenção da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico, que visa a combater a corrupção de funcionários públicos em transações comerciais internacionais, documento ratificado pelo Brasil no ano de 2000.
No Congresso, os 13 artigos do projeto deverão substituir integralmente o texto apresentado pelo deputado Henrique Fontana (PT-RS) em 2007, que defendia a responsabilização penal das empresas.
O governo cogitou manter parte do texto já em tramitação, permitindo o julgamento das empresas com base no direito penal, mas desistiu da ideia por três motivos centrais. Primeiro, tem dúvidas sobre a constitucionalidade de uma proposta nesse sentido. Depois, as penas que seriam impostas - multa e restrição de direitos - assemelham-se às que serão aplicadas no âmbito administrativo. E, terceiro, porque as leis específicas que permitem a condenação penal de empresas, como a lei dos crimes ambientais, têm gerado poucas punições. Pesquisa da Fundação Getúlio Vargas (FGV) que embasou a discussão da nova legislação mostrou que, de 45 casos analisados, apenas cinco chegaram a ser julgados no mérito. E dois desses já estavam prescritos.
Monitoramento do Pacto
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