TREs se unem contra ficha suja

Apesar da decisão do TSE, tribunais decidem rejeitar candidatos com processos criminais


Maiá Menezes e Fábio Vasconcellos

Na contramão da decisão do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), os presidentes de 26 tribunais regionais eleitorais do país decidiram ontem, por unanimidade, adotar maior rigor na avaliação de candidaturas de políticos que respondem a ações judiciais. Na prática, o entendimento deverá levar à impugnação de registros de candidatos a prefeito e vereador com ficha suja, mesmo que ainda não tenham sido condenados.

Em reunião no Rio, o colégio de presidentes de TREs também resolveu não publicar a lista com os processos de candidatos na internet.

Apenas o TRE do Paraná não enviou representante para o encontro, que termina hoje.

À frente do colégio dos TREs, o desembargador Cláudio Santos, presidente do TRE do Rio Grande do Norte, utilizou um exemplo extremo como argumento para defender a modificação dos critérios de registro de candidatos: — Vou dar um exemplo radical. Se hoje o Fernandinho Beira-Mar quisesse ser candidato e procurasse um partido, poderia ser, porque ele não foi efetivamente condenado. Há necessidade de se fazer alguma coisa.

O entendimento dos desembargadores é de que a Constituição é clara em relação à importância da moralidade para aqueles que assumem cargos públicos. O presidente do TRE do Amapá, Carmo Antônio de Souza, argumentou que, como há previsão constitucional para a questão da moralidade, não é preciso criar um lei específica para o tema em casos de candidaturas: — Para poder se candidatar ou prestar concurso para qualquer cargo de funcionário público, a pessoa tem de ter ficha limpa. Imagina as pessoas que assumem cargos importantes como presidente, vice-presidente, governador, prefeito e cargos legislativos em geral — disse Souza.

‘Sem a lei, lavamos as mãos?’, pergunta Wider

O desembargador Roberto Wider, presidente do TRE do Rio, também lembrou que concursos públicos exigem idoneidade do candidato: — Na eleição passada, encontramos candidato com 25 homicídios na folha corrida. Ele não poderia ser gari no Rio, por exemplo, mas prefeito, sim. Com a eleição, ainda ganham uma redoma de proteção quando se elegem. Sem a lei, nós lavamos as mãos? Há fundamentos constitucionais aos quais podemos recorrer — disse Wider, ressaltando que a manifestação do TSE (que decidiu, por 4 a 3, que o candidato só pode ser impugnado se tiver sido condenado em última instância) foi uma consulta: — Não estamos vinculados a ela (a decisão do TSE). É uma situação momentânea que pode ser reformulada.

A orientação será incluída em documento a ser divulgado hoje pelo colegiado. A preocupação dos presidentes de TREs é que os juízes ajam com bom senso na hora de avaliar que tipos de processos podem ser usados para vetar candidaturas. Durante o encontro, se comentou o caso de um pré-candidato que responde a 111 processos por crimes como roubo, furto e crime do colarinho branco.

— Não é possível que o Judiciário faça vista grossa a uma realidade dessa. Mas quero deixar claro que não é qualquer crime, porque isso poderia ser usado por um candidato contra outro. O juiz terá que agir com muita razoabilidade nesse avaliação — defendeu o desembargador Carmo de Souza, do Amapá.

O desembargador Cláudio Santos reafirmou a defesa da rigidez na julgamento de registros de candidatos: — Não é possível se admitir que um bandido, sob a proteção de um partido, seja candidato a prefeito. Tem gente que responde a inúmeros homicídios, com 500 cheques sem fundos, e que é prefeito.

A avaliação de que os escândalos de corrupção puseram a discussão na ordem do dia foi argumento para a maioria dos presidentes de TREs aprovar a decisão.

— A questão está amadurecendo. E, como está, não dá para continuar — disse o presidente do TRE de São Paulo, Mauro Cesar Muller.

— A vida pregressa deve ser levada em consideração, mas não para qualquer delito. Casos de homicídio culposo (sem intenção de matar) não devem ser levados em conta, mas fatos graves, como peculato, improbidade de forma reiterada e tráfico — concordou o presidente do TRE de Minas, Joaquim Herculano Rodrigues.

O desembargador Cláudio Santos sustentou que a lista de políticos processados, se divulgada pelos TREs, seria uma condenação prévia.