Volta a máfia dos fiscais

A máfia dos fiscais voltou a atuar, achacando os camelôs que trabalham irregularmente nas ruas de São Paulo. Agentes corruptos da Subprefeitura da Mooca extorquiam mais de R$ 1,1 milhão por mês de 7 mil ambulantes para permitir que vendessem suas muambas nas calçadas do Brás. A partir de denúncias de camelôs, o Ministério Público Estadual (MPE) investigou durante três meses as novas redes de extorsão. O assessor político da subprefeitura, Georges Marcelo Eivazian, e o agente de apoio fiscal Edson Alves Mosquera comandavam dois esquemas de arrecadação de propina - um que extorquia os vendedores de alimentos e o outro, os camelôs. Onze pessoas foram presas e duas estão foragidas.

O prefeito Gilberto Kassab determinou o afastamento de todos os envolvidos nas investigações feitas pelo MPE e pela Polícia Civil. O assessor político Georges Marcelo contava com a ajuda do irmão, o chefe dos fiscais do Brás, Felipe Eivazian. Os dois foram exonerados. O prefeito pediu às autoridades policiais que ampliem a investigação “para não ficar dúvidas sobre o trabalho da Prefeitura”.

As dúvidas, infelizmente, permanecerão enquanto a administração municipal de São Paulo não se dedicar com afinco à erradicação da verdadeira causa dessa modalidade de corrupção: o comércio ambulante irregular. Há dez anos perdeu-se uma oportunidade de dar um fim a esse tipo de comércio, ainda no governo Celso Pitta, quando os promotores do Grupo de Atuação Especial de Repressão ao Crime Organizado (Gaeco), do MPE, identificaram a primeira grande rede de extorsão que era constituída por fiscais e autoridades do Executivo e do Legislativo municipais.

Aquela máfia arrecadou, em cinco anos, pelo menos R$ 436 milhões dos comerciantes e ambulantes de São Paulo. Vereadores indicavam para cargos nas antigas administrações regionais seus apadrinhados, que montavam o esquema de cobrança de propina, com a ajuda dos fiscais. Mais de 1,5 mil pessoas foram ouvidas em inquérito e 53 foram denunciadas, incluindo 3 vereadores. Mas a Prefeitura não regularizou a atividade dos camelôs.

Outra oportunidade foi perdida em 2001, no primeiro ano do governo de Marta Suplicy, quando a juíza da 10ª Vara Civil, Isabel Cristina Modesto Almada, acatou procedimento do promotor Mário Malaquias, da Promotoria da Habitação e Urbanismo, contra a Prefeitura e estabeleceu o prazo de 90 dias para que todos os camelôs fossem cadastrados, e o de 30 dias para que os ambulantes ilegais fossem retirados das ruas. Se a Prefeitura não cumprisse a determinação, pagaria multa de R$ 10 mil por dia.

Marta Suplicy recorreu da decisão judicial, usando o surrado argumento de que o comércio ambulante era o único meio de sobrevivência para os desempregados.

Há muito se sabe que quem explora as ruas não são desempregados. Os camelôs são empregados de poderosos grupos de contrabandistas e receptadores, que abastecem o mercado com mercadorias piratas, roubadas e contrabandeadas. Tendo elevadas margens de lucros, não se importam em pagar propinas, corrompendo esquemas de fiscalização. Esse “custo” é baixo para quem tem liberdade de vender nas ruas mais movimentadas da cidade mercadorias roubadas que não pagam impostos.

Para acabar com o problema, o poder público teria de empenhar uma força-tarefa composta por policiais, promotores estaduais e federais, representantes das Secretarias das Subprefeituras, da Segurança Pública e da Fazenda, em operações articuladas com o objetivo de desmantelar todas as etapas da atuação dessas quadrilhas - do contrabando ao comércio ambulante, passando pela parte corrompida da máquina administrativa.

Se regulamentasse o comércio ambulante na cidade, respeitando o ordenamento urbano e oferecendo assistência social apenas àqueles que necessitam verdadeiramente de meios de sobrevivência, a Prefeitura certamente daria o mais duro golpe no esquema fraudulento que prejudica o comércio legal e compromete o serviço público.